Nazaré – Ba, 20 de maio de 2021
Prezados,
Ler essa carta me trouxe angústia. É absurdo que vocês precisem lutar e pedir apoio para aquilo que deveria ser concedido por direito. Saúde, educação, proteção ambiental e de povos nativos e minorias deveriam ser a prioridade dos governantes. Infelizmente, vê-se o contrário em nosso país. É comum observar indivíduos que esvaziam os significados de uma cultura, banalizam o pertencimento, identidade, espiritualidade, proteção e força dos povos indígenas.
A situação torna-se ainda mais grave quando um desses indivíduos é o atual presidente, Jair Bolsonaro, que não hesita em espalhar desinformação e discursos de ódio à população. Não há o mínimo de esforço para que os direitos básicos sejam garantidos. Os ataques às terras e povos indígenas continuam. Recentemente, os Yanomami foram atacados por garimpeiros armados e os Munduruku estão ameaçados. Enquanto isso, o país se afunda em mais mortes pela Covid-19, que afeta principalmente as populações subalternas e marginalizadas. O desmatamento segue aumentando, mas para eles é só o dinheiro que importa.
Há uma urgência pela demarcação de terras, para garantir a segurança e a preservação. O governo finge que não vê. Não há nenhum tipo de mobilização para impedir o genocídio, a destruição. A morte e os discursos racistas foram normalizados por uma parte da sociedade.
Acredito que muitas pessoas têm medo e ódio de tudo que foge das perspectivas vazias que semeiam. A luta dos outros não importa desde que não as atinjam. E é triste ver como o individualismo foi normalizado, sobretudo pelo capitalismo. Uma sociedade que enriquece os que já são ricos, pauperiza os pobres, dizima culturas e etnias que sofrem desde a invasão do Brasil.
Refletir sobre isso me lembra uma entrevista de Ailton Krenak para “Vozes Da Floresta – A Aliança dos Povos da Floresta de Chico Mendes a Nossos Dias”. A entrevista em si, é bastante enriquecedora, mas há uma parte específica referente ao pensamento coletivo da comunidade indígena e do sistema capitalista como predatório, excludente e racista, que se encaixam nessa análise. O viver para si, a “cultura do ‘eu’”, tão presentes na atualidade, possibilitam ações que excluem e dizimam uma parte enquanto favorecem outra, e impedem escolhas coletivas que visam o bem geral promovendo equidade.
Sinto que o individualismo nos tira a vida e nos condiciona à apenas existência. Pois a vida é coletiva e é esse pensamento em grupo que a movimenta. O olhar para o outro e ajudar como for possível na luta. Espero que em algum momento a sociedade possa mudar, embora isso pareça cada vez mais distante. Espero que nós não indígenas possamos sempre nos atentar para as intempéries cometidas contra os seus povos, para a necessidade de proteger e cuidar dos próximos, da natureza e de tudo que provém dela, de respeitar os deuses, as forças, culturas, tradições. Que nos posicionemos contra as práticas de opressão, pois o silêncio, nesses casos, é o mesmo que coadunar com o opressor.
Fernanda Nogueira dos Santos
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