A PL 490 e o Acampamento Luta pela Vida

O mês de agosto está sendo palco de uma discussão importantíssima para a estrutura sociopolítica dos povos indígenas e do Brasil: o marco temporal e a movimentação sociopolítica em torno da questão. A problemática que precede o tema discutido pode, dentre outras formas, ser explicada sucintamente através de uma equação, onde vê-se cerca de 97 mil proprietários rurais com posse de, aproximadamente, 21,5% do território brasileiro em contraste contra 572 mil indígenas ocupando pouco mais da metade dessa área, cerca 13% do território.


A discrepância exposta pelos números é resultado de um processo de supressão de direitos que os povos indígenas sofrem desde quando o empreendimento colonizatório desembarcou do Atlântico. Desde então, suas terras foram usurpadas, seus direitos suprimidos e suas vidas ameaçadas e violentadas.


O marco temporal, nada mais é do que uma afirmação dessa maculação simbólica e material que atravessa os povos indígenas. O que atualmente está em julgamento dentro do Supremo Tribunal Federal (STF) desde quinta-feira, 26 de agosto, é a proposta de congelamento do processo de demarcação de terras indígenas, que defende que apenas as terras que já estavam sob o domínio de indígenas, em 5 de outubro de 1988 podem ser reivindicadas.


No entanto, isso fere a constituição, haja vista que vai de contra ao artigo 231,o qual prega a salvaguarda dos direitos indígenas, incluindo a posse de seus territórios originários.


Mesmo sendo uma proposta que foge do acordo constitucional, o marco temporal segue com defesas de aprovação devido aos interesses dos grandes latifundiários e produtores rurais brasileiros, que visam o lucro acima de tudo, até mesmo das vidas indígenas. Vidas essas que são tidas como um empecilho para a noção violenta e destrutiva de progresso imposta pelo capitalismo.

É muito importante salientar que essa aprovação parte não só dos ruralistas, mas também de parlamentares. O que é extremamente preocupante, haja vista que o poder de decidir diversos caminhos que o país irá seguir está nas mãos dessas pessoas.

O impasse é claro, e o epicentro do embate entre indígenas e ruralistas se materializou na capital federal, Brasília. Sendo assim, desde a semana passada, imagens de protestos das mais diversas naturezas foram registradas e noticiadas em veículos midiáticos.

À frente dessas movimentações estão diversas organizações e lideranças indígenas, que estão lutando bravamente e com todas as armas possíveis contra a aprovação do marco e em favor da manutenção de suas terras, memórias, vidas e existências.

Para encontrar campanhas de arrecadação e fazer sua doação pela permanência dos povos indígenas no Acampamento Luta Pela Vida, acesse o link aqui.

Curso de extensão: Povos Indígenas no Brasil

Juntamente ao retorno do semestre, o projeto As Cartas Indígenas ao Brasil anuncia o curso de extensão: Povos Indígenas: Entre cartas e fotografias.

Com carga horária de 68h (40h atividades síncronas / 28h atividades assíncronas) e certificado de participação, o curso tem como público-alvo: artistas visuais, professores da educação básica e pesquisadores interessados nas questões indígenas

Você pode se inscrever clicando aqui. 

As vagas são limitadas e as inscrições vão até o dia 20 de agosto! 

Resumo:

Neste curso faremos uma análise da presença dos povos indígenas no Brasil, a partir da leitura de suas cartas e dos modos como suas imagens foram reproduzidas em fotografias e outros suportes visuais. Trata-se de um curso direcionado para a comunidade não-indígena ampliar seus olhares sobre os modos de escrever dos indígenas, bem como para analisar criticamente, através da leitura de suas imagens, os modos como os indígenas foram vistos e iconografados na história literária e política do Brasil. O curso será ministrado em duas etapas e contará com a presença de pesquisadores especialistas na área de documentação histórica e imagética dos povos indígenas. Durante as aulas, serão apresentadas as cartas produzidas por indígenas em diferentes tempos da história do Brasil, para cada tempo histórico das cartas, analisaremos também a produção imagética do período até chegarmos às práticas contemporâneas de fotografação.

Público-Alvo: Artistas visuais, professores da educação básica e pesquisadores interessados nas questões indígenas


Link do formulário: https://forms.gle/hX5NfxmUFvMiD2y99


Cartas para não morrer.

    


     João Natalício dos Santos Xukuru-Kariri foi assassinado a facadas na madrugada de 11 de novembro de 2016¹ na porta de casa. Seu João, liderança indígena, morreu no quintal da sua residência na aldeia Fazenda Canto, TI Xucuru-Kariri, fontes indicam que a liderança foi assassinada por conhecidos que o atraíram e desferiram golpes até sua morte.

Assim como seu João, muitos indígenas são assassinados no Brasil a todo momento, a única diferença está na proveniência dos golpes que dizimaram povos inteiros. O Estado ainda se mostra como máquina mais letal no etnocídio de povos nativos, quando a omissão se é somada à invasão e exploração de terras agrava o cenário predominante de violência.

As violências sutis são somadas ao longo dos séculos de exploração e indeferimento dos direitos dos povos indígenas. Os direitos mais básicos como moradia, saúde e educação são exigências recorrentes nas cartas escritas pelos povos indígenas e endereçadas ao Brasil, Brasil esse cada vez mais distante da performance de destinatário.

Só no primeiro ano do Governo Bolsonaro foi registrado o maior número de lideranças indígenas assassinadas comparadas aos 11 anos anteriores segundo o relatório emitido pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI). As invasões de terras e esquemas de grilagem ganharam destaque desde o cumprimento da promessa de governo do presidente em que afirmou não assinar mais nenhuma nova demarcação de Terras Indígenas, com isso os conflitos frequentes aumentaram a lista de indígenas assassinados, como os 40 indígenas Guajajara, incluindo Paulino Guajajara, mortos em conflitos com madeireiros entre os anos de 2000 e 2019.

Além da luta por direitos e contra invasores, os povos indígenas do Brasil vêm sofrendo a defasagem na educação e saúde, esse último agravado pela pandemia e que envolve uma série de fatores e consequências que agridem de diferentes formas o ser indígena. Recentemente temos tido contato com lutas que parecem inéditas para alguns grupos, a necessidade de ação e união para o enfrentamento de verdadeiros atentados contra a vida, atentados esses que os povos indígenas vivenciam há séculos e que são marcados por nomes que muitas vezes passam por desconhecidos - isso quando são noticiados. Nomes como Nísio Gomes, Paulino Guajajara, Kunumi Poty Verá, Simeão Vilhalva, João Natalício e tantos outros guerreiros e guerreiras indígenas serão sempre recordados em cartas para não morrer.


¹://cimi.org.br/2016/10/38918/ 


Leia mais em:

https://apublica.org/2020/04/sob-governo-bolsonaro-conflitos-no-campo-aumentam-e-assassinatos-de-indigenas-batem-recorde/ 


https://www.brasildefato.com.br/2020/09/30/casos-de-violencia-contra-indigenas-aumentam-150-no-primeiro-ano-de-bolsonaro